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Biometano: o tesouro de R$ 300 bilhões e a miopia que pode custar o futuro do Brasil


O agronegócio tem a molécula, a indústria clama por ela, mas o valor permanece trancado.

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A Paz 🙏🏼

O agronegócio tem a molécula, a indústria clama por ela, mas o valor permanece trancado. Um diagnóstico sobre a fragmentação do ecossistema e a arquitetura de negócios necessária para destravar esta riqueza.

O Brasil está, neste momento, sobre um tesouro energético de proporções geracionais. As estimativas mais conservadoras apontam para um mercado potencial de biometano que ultrapassa os R$300 bilhões, aproximadamente US$60 bilhões.Não se trata de uma aposta futurista, de uma promessa distante. Trata-se de uma riqueza latente, que brota dos resíduos de nossa pujança agrícola, da vinhaça das usinas sucroalcooleiras, dos dejetos da produção animal. Uma molécula capaz de acelerar nossa descarbonização, garantir nossa soberania energética e redefinir a competitividade do nosso agronegócio.

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E, no entanto, este gigante adormecido teima em não despertar. Por quê?


Em minha jornada como estrategista, mediando conversas entre os titãs do agronegócio e os gigantes da indústria, tenho testemunhado repetidamente o mesmo paradoxo pungente. De um lado da mesa, o diretor de uma potente usina, um homem cujo universo é medido em toneladas de cana por hectare e eficiência de moagem. Ele sabe que seus subprodutos têm valor energético, mas enxerga a construção de uma planta de biometano como um desvio complexo e de altíssimo CAPEX de seu core business. Sua preocupação legítima é: "Quem me garante a demanda firme para um investimento desta magnitude?"

Do outro lado, o diretor de operações de uma grande indústria ou de uma frota logística, cuja alma é assombrada pela volatilidade do preço do diesel e pela pressão crescente por metas de ESG. Ele ouve sobre o biometano como a solução limpa e de custo potencialmente menor. Mas sua pergunta, igualmente legítima, é:


"Como posso ancorar minha operação em um combustível cuja oferta depende de uma safra? Quem me garante a molécula na ponta, com a mesma confiabilidade de um gasoduto da Petrobras, 24 horas por dia, 7 dias por semana?"

Eles estão na mesma sala, mas em mundos diferentes. Falam sobre a mesma molécula, mas em idiomas de risco e oportunidade que não se cruzam. O resultado é a paralisia.

O diagnóstico que emerge dessa disfunção não é uma mera "falha de comunicação". É o que denomino de miopia de ecossistema. Cada setor, em sua busca obcecada pela otimização de seu próprio silo, tornou-se cego para a sinergia monumental que existe entre os silos. O valor real não está mais dentro da fazenda ou dentro da fábrica. Ele está na arquitetura inteligente e estratégica da conexão entre elas.

O papel que temos desempenhado na Ephata Solutions é precisamente o de atuar como esses arquitetos. Não como meros intermediários, mas como os estruturadores de um novo ecossistema. Um trabalho que exige uma imersão profunda na "alma" de cada negócio para construir um modelo que transforme a desconfiança mútua em um propósito compartilhado e lucrativo.


A jornada para destravar o valor: da tradução à orquestração


Esqueça a ideia de uma solução de prateleira. A construção dessa ponte é um processo artesanal e estratégico, que se desdobra em fases de complexidade crescente.


Primeiro, é preciso sentar-se à mesa não para negociar, mas para traduzir. 

É um trabalho quase diplomático de converter as dores e as capacidades de cada parte em uma linguagem de valor comum. É transformar a "incerteza da safra" do produtor em "mecanismos de garantia de suprimento e armazenamento" para o consumidor. É converter a "necessidade de descarbonização" do consumidor em uma "tese de investimento com receita previsível" para o produtor. O resultado desse processo não é um contrato, mas um business case robusto, uma "pedra de Roseta" que alinha as expectativas e prova, com números, que o benefício conjunto supera em muito os riscos individuais.


Com a linguagem unificada, passamos à arquitetura do modelo de negócio. É aqui que a engenharia da parceria ganha forma. O Brasil, com o avanço de legislações como o Marco Legal do Biometano e programas como o Metano Zero, já oferece o arcabouço para estruturas sofisticadas. O que desenhamos? Talvez uma SPE (Sociedade de Propósito Específico), onde usina e indústria se tornam sócias na planta, dividindo riscos e frutos. Ou, como temos visto ganhar tração, um contrato de offtake de longo prazo (10-15 anos), com cláusulas de take-or-pay que dão ao produtor a segurança necessária para buscar financiamento, e ao consumidor, a previsibilidade de preço e volume que o protege da volatilidade dos combustíveis fósseis. Cada modelo é uma solução de engenharia de negócios para um problema específico de confiança.


Mas a verdadeira virada de chave, o que nos levará dos projetos-piloto aos R$ 300 bilhões, está na terceira fase: a orquestração do ecossistema. A ponte entre uma usina e uma indústria é vital, mas ainda é uma ponte vicinal. Precisamos construir a "rodovia" do biometano. E isso significa trazer para a mesa os demais atores, hoje dispersos. Significa sentar com os agentes financeiros (de um BNDES a um FI-Infra) para desenhar estruturas de financiamento que entendam as particularidades do setor. Significa conectar os fornecedores de tecnologia para garantir a eficiência e a escala da produção. Significa dialogar com as agências reguladoras para criar a segurança jurídica necessária. E, crucialmente, significa agrupar múltiplos consumidores em hubs de demanda regionais, justificando investimentos que, para um único cliente, seriam inviáveis.


O Brasil possui uma vocação divina para liderar a revolução da bioenergia. O biometano não é uma aposta; é uma consequência lógica da nossa força no agronegócio. Deixar que essa oportunidade monumental se perca por uma falha de articulação, por uma miopia de ecossistema, não seria apenas um erro estratégico. Seria um atestado de nossa incapacidade de traduzir nosso potencial em grandeza.


A tarefa é complexa. Exige uma visão que transcenda as cercas de nossas próprias fazendas e os muros de nossas próprias fábricas. Exige uma liderança que pense não em termos de transações, mas de ecossistemas. Que não busque apenas otimizar o seu elo da corrente, mas forjar uma corrente inteiramente nova.


Se sua organização, seja ela a dona da molécula ou a sedenta por ela, sente o peso dessa desconexão e vislumbra o potencial dessa sinergia, convido-o a uma conversa. O momento de construir essas pontes é agora. O futuro não espera pelos míopes.


A gente se vê na vanguarda da energia.

Rumo ao TOPO 🚀


Marcio Almeida[www.marcioalmeida.co]

 
 
 

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